A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) é contrária ao fim do parcelamento sem juros, medida que vem sendo discutida para lidar com as elevadas taxas do rotativo do cartão de crédito. De acordo com a Entidade — que lidera empresas do comércio, serviços e turismo no Estado de São Paulo —, a medida não serve como antídoto para o problema e pode prejudicar milhares de negócios, em especial os micro e pequenos. A Federação listou uma série de propostas e, entre elas, sugere um teto para o rotativo, a exemplo do que já ocorre com o cheque especial.
A preocupação da FecomercioSP é que o limite, ou o impedimento, da utilização do parcelamento sem juros cause reverberações adversas na economia. O crédito, aliado ao emprego e à renda, é um dos pilares essenciais na determinação dos padrões de consumo da população. A Entidade ainda lembra que o instrumento desempenha papel imprescindível no desempenho econômico do varejo nacional, atuando como um propulsor das inclusões financeira e social. Além disso, a medida poderia comprometer, ao invés de melhorar, a saúde financeira dos consumidores, exacerbando a inadimplência.
Para o comércio, esse mecanismo não só funciona como uma alavanca do valor médio das transações como também aprimora, significativamente, a administração do estoque, já que ao oferecer a possibilidade de parcelamento, os consumidores podem adquirir outros produtos. Além disso, é importante reconhecer que o rotativo no cartão e o parcelamento sem juros são instrumentos diferentes. No primeiro caso, os juros incidem sobre o valor da fatura quando o consumidor não paga dentro do prazo. Já no segundo, um acordo é firmado entre consumidor, lojista e administradora de cartões para viabilizar as vendas do varejo. A mistura dos conceitos, alerta a FecomercioSP, pode gerar grandes problemas à economia caso o fato não seja levado em conta nas propostas.
Segundo a Federação, a concepção de que os exorbitantes juros do rotativo se devem ao parcelamento sem juros carece de precisão analítica. O dilema reside, pelo contrário, nas taxas astronômicas associadas ao instrumento. Essa análise se torna ainda mais evidente quando se nota a envergadura financeira que o mercado emissor de cartões de crédito representa.
Um levantamento realizado pelo J.P. Morgan revela que o universo dos cartões de crédito é intrinsecamente lucrativo, e os juros rotativos não desempenham papel primordial para equilibrar os custos inerentes ao parcelamento — modalidade essa que, por sinal, configura-se como um manancial de rentabilidade para os bancos. Em 2022, o segmento emissor de cartões de crédito mobilizou impressionantes R$ 85 bilhões. Desse volume financeiro, a Tarifa de Intercâmbio (TIC) correspondeu a R$ 23,7 bilhões (representando 28%), enquanto o rotativo abarcou R$ 26,9 bilhões (equivalente a 32%) e o parcelamento onerado com juros atingiu R$ 22,3 bilhões (ou 26% do total).
Além disso, os emissores colhem benefícios advindos de outras tarifas, como as anuidades pagas pelos portadores dos cartões. Dessa forma, conclui a Entidade, é evidente que há margem para que as instituições financeiras procedam com a redução das taxas de juros no rotativo. Para enfrentar esse desafio, a FecomercioSP propõe:
- estabelecer teto para a taxa do rotativo: fixar limite de acordo com a faixa de renda do consumidor ou um teto a exemplo do que aconteceu com os juros do cheque especial.
- promover a competição no mercado de crédito: diminuir barreiras para encorajar novos agentes a entrar no mercado;
- facilitar a portabilidade de crédito: permitir que os consumidores busquem melhores condições para pagamento das dívidas, de forma clara e transparente e estimular a adesão ao Open Finance, inclusive sua renovação de consentimento para o compartilhamento de dados, reduzindo a assimetria informacional entre instituições, melhorando as condições dos produtos e serviços ofertados;
- Adotar iniciativas de educação financeira/uso consciente do crédito: conscientizar acerca dos riscos envolvidos e disponibilizar informações com linguagem acessível aos usuários — medida reconhecida como eficaz pelo próprio Banco Central (Bacen).
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